quarta-feira, 5 de junho de 2013

Histórias - Ser pracheiro é...

fotografia: Roberto Furtado
Pescar de prancha é algo que soa um tanto quanto estranho para quem desconhece a prática. Até pouco tempo atrás, chamavamos de pesca de prancha, mas um amigo e praticante dos mais mutucas (Canali), logo tratou de arrumar um nome. Nomeou a nós mesmos, os praticantes, de Surfisherman (Surfisherman = surf + fishing + praticante). Somos poucos, apesar do crescente número de adeptos, talvez pela dificuldade da prática. A dificuldade não esta restrita a uma arte de conhecer técnicas de pesca, nem de dominar técnicas de surf, mas na combinação das duas. Detalhes percebidos na tentativa, e acredite eles existem em quantidade.
É isto aí mesmo, pescar de prancha... é coisa de macho mesmo!
Bom pescador de prancha tem que ter um pouco de tudo! Um pouco de persistência, um pouco de surfista, um pouco de pescador, um pouco de valentia, um pouco de confiança, um pouco de professor, um pouco de aluno, um pouco de amizade (ensinar os amigos), um pouco de inteligência e de burrice, um pouco de noção das correntes marítimas, e muito amor ao mar.
Depois de alguns poucos dias sem ver o mar, já sinto falta do mesmo e deste "esporte". Sento em uma poltrona de minha casa, apoio os braços sobre os descansos e começo a lembrar. Visualizo a entrada na água como se fosse imagem de horas atrás...  sinto o gosto da água salgada na boca! Calço os pés de pato, coloco a prancha em baixo do braço, na outra mão seguro a garatéia... as vezes, entro na água aos pulos, as vezes vagarosamente. Há quem possa confirmar... Eventualmente, urino na própria roupa de borracha... e o que era frio de estalar, passa a ser quente como o café! ehehehehehehheeheheh Inversamente proporcional! Quem diria isto? Caminhando na água, sinto a temperatura fria, parece que não vou me acostumar, sigo até a altura da cintura... e sem nenhum pouco de paciência de caminhar no fundo esburacado do mar, logo vou subindo na prancha... bato os pés, por vezes remo com o braço que sobra. A cada onda que passo, uma vitória! Cada onda, uma emoção... um joelhinho sob a onda maior, uma vaca no tombo resulta numa bela chafurdada, mas logo ultrapasso a arrebentação. Vejo uma imensidão de águas revoltas ou calmas, depende do dia. Uma sensação de infinito, longe apenas 250 metros da beira da praia. Escolho um lugar pra largar a isca, e desço-a devagar, assim sondando a profundidade do local. Tchê, algumas vezes... mais de cinco metros! Estranha capacidade da corrente, de criar "valetas" sobre o arenoso fundo do mar.
O desejo de chegar ao objetivo, e uma alegria de ter vencido a água... pelo menos por enquanto. Para sair... encosto com cautela na arrebentação, e espero. Escolho a melhor posição, onda e nível do mar... e pego a onda sentido a força do oceano. Correndo com a água que gira por cima da própria água, surgem milhões de coisas em minha mente. Parece um longo tempo, mas não passam de poucos segundos. Já na meia água, junto a prancha e os pés de pato. Fim da atitude física, e começo da espera... um jogo mental. Será que o peixe vai bater? Era o local correto? Assim somos... pacienciosos, vitoriosos, amigos, sonhadores... meros sonhadores, humildes, felizes na água, tristes em terra firme. Alegres na presença dos amigos e do mar... o infinito nos aguarda! Santa felicidade de existir..

obs: este texto foi produzido e publicado em diversos canais de pesca nos por volta de 2003. Hoje, os prancheiros são vários no RS, e no mundo, mas poucos compreendem o verdadeiro significado da pesca com prancha. Ser prancheiro é ter um algo mais que somente os pescadores de alma compreendem. Imagem meramente ilustrativa.

Roberto Furtado

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