| fotografia: Roberto Furtado |
Em setembro de 2002, eu
e um amigo investimos em uma aventura que até hoje lembramos e rimos. Depois de
aprendermos um pouco sobre uma versão funcional sobre a pesca de prancha e
rumando para a experiência, resolvemos tentar uma pescaria de Miraguaia. Apenas
uma entre tantas tentativas sem êxito, mas aprendemos muito. Não lembro quem
entrou no mar primeiro, e a ordem não é importante. O fato sucedeu quando
entrei no mar e meu amigo Marcio controlava a linha da carretilha para mim. O
mar era calmo, cheio e turvo, apavorante e ao mesmo tempo... instigante. A água
era o legítimo chocolate! Rumei na direção que imaginei estar o navio em
relação a beira de praia, e logo vi uma grande marcação... era a presença do
fantasma de ferro, ainda distante. A corrente era suave, porém constante. Pouco
a pouco me aproximei daquela marcação, que seguidamente ficava
"invisível", oculta pela ondulação. Entre uma ondulação e outra, vi
algo por instantes... foi tão rápido que não tive qualquer certeza, poderia ser
qualquer coisa. Talvez um objeto flutuante, naquele momento não me
impressionei. O valo era largo, fundo e lembrava o mar aberto, distante cerca
de 300
metros da praia. Distância que
hoje acho pequena e relativamente fácil de ultrapassar.
Quando vi a marcação novamente, rumei na direção
dela, e agora eu estava perto. Imagino que estaria a cerca de 15
metros, talvez menos... a referência dentro do mar, é
imprecisa! Neste momento, a marcação fica mais visível... e o gigante de ferro
bufa água para cima, deslocando água como em uma nascente! Me preparo para
largar a linha. Casualmente, quando eu me preparava para soltar a espera, surge
um pequeno vagalhão. Com este vagalhão uma nova marcação surge do navio, o
mesmo assopra pra cima, uma grande quantidade de água... e com ela, um grande
animal aflora na superfície. Um peixe enorme, colocando as nadadeiras acima da
superfície, um peixe amarelo... dourado! Apavorei-me e no primeiro instante
pensei na burra lógica de inexperiente prancheiro... seria um tubarão!!! “Gritei
mãe de Deus” na mesma hora... foi automático! Um choque que causou a liberação
de todas as substâncias químicas do pânico e instintos de sobrevivência. No
segundo instante, usei novamente a lógica pouco inteligente, e quase falei em
voz alta... "tubarões nunca andam sozinhos, estou cercado!" Tentei
largar a espera e ao mesmo tempo me virei para a praia, a linha enrolou-se na
minha mão, mas na bateção de mãos e pés, desprendeu-se por conta.
Desesperadamente bati braços e pernas na intenção de alcançar um deslocamento
rapido suficiente para fugir do suposto ataque coletivo de tubarões. No
terceiro acesso de estupidez, pensei que deveria parar de bater os braços, pois
os tubarões famintos morderiam minhas mãos... e aí me venceriam facilmente.
Então bati os pés mais rápido ainda, senti todas as dores do mundo naquelas
pobres pernas. Mesmo com dores, continuei... não podia me render aos peixes
“assassinos”. O mesmo valo largo pra chegar, era largo pra voltar! Neste meio
tempo, voltei a ser católico, e continuei rezando para que os peixes demoníacos
me deixassem em paz. Na velocidade de um cruzeiro atrasado,
alcancei a "rebentação" (arrebentação), peguei qualquer onda que nem
me lembro. Cheguei bufando na areia, não podia falar, e mal podia respirar. O
amigo havia visto aquilo tudo, e estranhou muito... perguntou-me o que vi, e
logo expliquei que teria visto um tubarão. Ele logo, perguntou-me se estava
louco e duvidou, apesar de acreditar que algo havia me assustado. Subimos na
duna em frente, e ficamos a olhar... o peixe era tão grande, que podia ser
visto de cima da duna a mais de 300
metros de
distância. Era um peixe que parecia exibir-se, e aflorava seguidamente na
superfície. Marcio, questionou-me muitas vezes, alegando que tubarões não fazem
isto. E pra aumentar ainda mais nossos anseios, ele começou a ver mais outras
duas aparições, distando semelhante, porém em pontos diferentes. Era a certeza
de não um, mas de três peixes. Passado o estado de choque, retrocedi as imagens
claras em mente, e lembrei de detalhes... o peixe era de um dourado único e
refletivo, e sua "pele" tinha contornos sugerindo a presença de
escamas. A dorsal que tanto me assustou, apresentava raiamentos, como de uma
corvina! Não era corvina, eu, pescador de corvinas sabia que não existiria uma
corvina daquele tamanho, e que somente um peixe parece tanto com ela.
Definitivamente, era uma miraguaia, o lendário peixe perseguido por meus sonhos
de infância. Chegara eu tão próximo do peixe, e por ignorância, medo tive de um
animal tão pacífico! Não lembro de outros detalhes neste dia, mas nunca
esquecemos o mesmo... haviam muitos peixes presentes e não conseguimos capturar
nenhum exemplar. Uma única batida perdida, nenhuma surpresa para dois
inexperientes prancheiros. A certeza pela aparição nos garantiu esperança, e a
mesma alimenta nossa busca até os dias de hoje. Já tivemos sucesso, mas quando
lembro deste fracasso, me surge uma alegria momentânea. Lembro do episódio com
muita saudade e graça.
obs: prancheiro é como chamamos o pescador que usa uma prancha para colocar a linha no mar. No arremesso, este local não é alcançado, mas com o uso da prancha, o pescador atinge o local. A imagem do post é meramente ilustrativa.
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