segunda-feira, 3 de junho de 2013

Histórias - Aventura de um Prancheiro Medroso

fotografia: Roberto Furtado
Em setembro de 2002, eu e um amigo investimos em uma aventura que até hoje lembramos e rimos. Depois de aprendermos um pouco sobre uma versão funcional sobre a pesca de prancha e rumando para a experiência, resolvemos tentar uma pescaria de Miraguaia. Apenas uma entre tantas tentativas sem êxito, mas aprendemos muito. Não lembro quem entrou no mar primeiro, e a ordem não é importante. O fato sucedeu quando entrei no mar e meu amigo Marcio controlava a linha da carretilha para mim. O mar era calmo, cheio e turvo, apavorante e ao mesmo tempo... instigante. A água era o legítimo chocolate! Rumei na direção que imaginei estar o navio em relação a beira de praia, e logo vi uma grande marcação... era a presença do fantasma de ferro, ainda distante. A corrente era suave, porém constante. Pouco a pouco me aproximei daquela marcação, que seguidamente ficava "invisível", oculta pela ondulação. Entre uma ondulação e outra, vi algo por instantes... foi tão rápido que não tive qualquer certeza, poderia ser qualquer coisa. Talvez um objeto flutuante, naquele momento não me impressionei. O valo era largo, fundo e lembrava o mar aberto, distante cerca de 300 metros da praia. Distância que hoje acho pequena e relativamente fácil de ultrapassar.
Quando vi a marcação novamente, rumei na direção dela, e agora eu estava perto. Imagino que estaria a cerca de 15 metros, talvez menos... a referência dentro do mar, é imprecisa! Neste momento, a marcação fica mais visível... e o gigante de ferro bufa água para cima, deslocando água como em uma nascente! Me preparo para largar a linha. Casualmente, quando eu me preparava para soltar a espera, surge um pequeno vagalhão. Com este vagalhão uma nova marcação surge do navio, o mesmo assopra pra cima, uma grande quantidade de água... e com ela, um grande animal aflora na superfície. Um peixe enorme, colocando as nadadeiras acima da superfície, um peixe amarelo... dourado! Apavorei-me e no primeiro instante pensei na burra lógica de inexperiente prancheiro... seria um tubarão!!! “Gritei mãe de Deus” na mesma hora... foi automático! Um choque que causou a liberação de todas as substâncias químicas do pânico e instintos de sobrevivência. No segundo instante, usei novamente a lógica pouco inteligente, e quase falei em voz alta... "tubarões nunca andam sozinhos, estou cercado!" Tentei largar a espera e ao mesmo tempo me virei para a praia, a linha enrolou-se na minha mão, mas na bateção de mãos e pés, desprendeu-se por conta. Desesperadamente bati braços e pernas na intenção de alcançar um deslocamento rapido suficiente para fugir do suposto ataque coletivo de tubarões. No terceiro acesso de estupidez, pensei que deveria parar de bater os braços, pois os tubarões famintos morderiam minhas mãos... e aí me venceriam facilmente. Então bati os pés mais rápido ainda, senti todas as dores do mundo naquelas pobres pernas. Mesmo com dores, continuei... não podia me render aos peixes “assassinos”. O mesmo valo largo pra chegar, era largo pra voltar! Neste meio tempo, voltei a ser católico, e continuei rezando para que os peixes demoníacos me deixassem em paz. Na velocidade de um cruzeiro atrasado, alcancei a "rebentação" (arrebentação), peguei qualquer onda que nem me lembro. Cheguei bufando na areia, não podia falar, e mal podia respirar. O amigo havia visto aquilo tudo, e estranhou muito... perguntou-me o que vi, e logo expliquei que teria visto um tubarão. Ele logo, perguntou-me se estava louco e duvidou, apesar de acreditar que algo havia me assustado. Subimos na duna em frente, e ficamos a olhar... o peixe era tão grande, que podia ser visto de cima da duna a mais de 300 metros de distância. Era um peixe que parecia exibir-se, e aflorava seguidamente na superfície. Marcio, questionou-me muitas vezes, alegando que tubarões não fazem isto. E pra aumentar ainda mais nossos anseios, ele começou a ver mais outras duas aparições, distando semelhante, porém em pontos diferentes. Era a certeza de não um, mas de três peixes. Passado o estado de choque, retrocedi as imagens claras em mente, e lembrei de detalhes... o peixe era de um dourado único e refletivo, e sua "pele" tinha contornos sugerindo a presença de escamas. A dorsal que tanto me assustou, apresentava raiamentos, como de uma corvina! Não era corvina, eu, pescador de corvinas sabia que não existiria uma corvina daquele tamanho, e que somente um peixe parece tanto com ela. Definitivamente, era uma miraguaia, o lendário peixe perseguido por meus sonhos de infância. Chegara eu tão próximo do peixe, e por ignorância, medo tive de um animal tão pacífico! Não lembro de outros detalhes neste dia, mas nunca esquecemos o mesmo... haviam muitos peixes presentes e não conseguimos capturar nenhum exemplar. Uma única batida perdida, nenhuma surpresa para dois inexperientes prancheiros. A certeza pela aparição nos garantiu esperança, e a mesma alimenta nossa busca até os dias de hoje. Já tivemos sucesso, mas quando lembro deste fracasso, me surge uma alegria momentânea. Lembro do episódio com muita saudade e graça. 

obs: prancheiro é como chamamos o pescador que usa uma prancha para colocar a linha no mar. No arremesso, este local não é alcançado, mas com o uso da prancha, o pescador atinge o local. A imagem do post é meramente ilustrativa.

Nenhum comentário: